África

dois livros sobre mitologias

Li simultâneamente dois livros sobre mitologias (mitologia é tudo o que não se refere à “minha” religião), adquiridos por R$ 10,00 cada um:
O Grande Livro da Mitologia Egípcia, de Claudio Blanc (editora Camelot, 2021, 144 p.) e
Deuses Romanos e de Outras Mitologias, de Herma Wilson (editora Prime HB Hunter Books, 2016, 176 p.).
O livro que trata exclusivamente das religiões do antigo Egito aborda superficialmente os faraós e a história da antiga potência e traz verbetes sobre cerca de cinqüenta divindades cultuadas em distintas épocas.
O segundo bàsicamente aborda as semelhanças dos deuses gregos e romanos, e suas lendas, e ao final ràpidamente aborda outras mitologias, incluindo a egípcia, e passa depois à celta, teutônica, hindu, africana e ameríndia-asteca.
Os dois livros são superficiais, resumindo outras tarefas já realizadas por outros autores, em outros países e tempos.
De um lado, colecionam artigos encontrados na Wikipedia, e de outro apenas lançam curiosidades e clichês já editados em trabalhos mais profundos.
A ênfase nas lendas de trindades divinas poderia ser mais elaborada, e não apenas en passant. Bibliografias mencionadas parecem ter sido incluídas apenas para constar, sem mostrar onde se encaixam nos diversos capítulos.
A leitura desses dois livros pode ser útil como a dos antigos almanaques. Nenhum dos dois serve, porém, de referência sobre o assunto.

Leitura durante a pandemia

Durante o “pandemõnio” criado pela incompetência dos governantes em geral, (em todos os cantos do mundo esférico), fui ler (e reler) alguns livros.
Alguns eram indicações de uma roda de leitura da qual eu tinha iniciado a participar havia pouco tempo.
O primeiro da lista cheguei a ler “em papel”, pois já estava agendado.
Foi o antigo “Os meninos da Rua Paulo”, de Ferenc Molnár (Cosac Naify, tradução de Paulo Rónai). Já conhecia o livro e tenho vagas lembranças de um filme nele baseado. Confesso que o que mais me marcou foi a tradução de Paulo Rónai, que se preocupou em traduzir palavras eslovacas, ou alemãs, mas preferiu deixar de lado as óbvias explicações sobre palavras e apelidos húngaros, que naturalmente eram do conhecimento do tradutor (mas não do leitor brasileiro). Nemecsek não era um acaso, criado por Molnár.

 

 

O livro seguinte foi “O quarto de Giovanni”, de James Baldwin (Companhia das Letras), que obtive em alguma versão de livro eletrônico. Li com os olhos saltando páginas na tela. Entendi a obra, mas não me atentei o suficiente para ousar fazer comentários.

As reuniões da roda de leitura foram “traduzidas” para a tela de computador, como ensina a bíblia do “novo normal”.
Não participei delas.
Pelas fotos das reuniões, foi visível observar o sono e a dispersão. dos participantes.

 

Baseado nas pré-reuniões virtuais, em whatsappp, fui tentar ler outros livros, que eu já tinha em casa.

“A Metamorfose”, de Kafka.

 

 

obras de Alan Poe,

alguns contos de Lygia Fagundes Telles,

algo de Dostoiévski,

Grande Sertão de Guimarães Rosa,.

Creio que Fernando Pessoa também fez parte da lista, não estou certo disso.
A maioria eram obras que eu tinha adquirido há décadas, em coleções da Nova Aguilar, em papel bíblia com fonte Minion 9.5,
Desisti de tentar me interessar pela relação dos livros que seriam debatidos na roda de leitura.

Tentei ampliar o espectro de leituras, com os livros para tela de commuitador, e passei os olhos por

Contos africanos – Ernesto J. Rodríguez Abad = Callis Editora

Três Ratos Cegos – Agatha Christie – Globo Livros

Biblioteca sobre Rodas – David Whitehouse – Rocco.

O resultado foi sempre muita dor de cabeça, embora eu tivesse tido uma consulta com oftalmologista em fevereiro, último mês pré-confinamento. e ele havia elogiado a visão, salientando que não havia qualquer tipo de lentes de correção para prescrição.

Ah, deram-me também a alternativa dos áudiolivros (audiobook).
Excelentes para dormir, tal como faziam as amas no passado.
Se há algo que me entorpece é ouvir narrações e os abomináveis podcasts tão em moda, para quem não tem tempo a perder enquanto dirige nos congestionamentos.
Com relação aos áudios, não se pode deixar de mencionar o incômodo de buscar onde ficou, para trás, a parte que quer ouvir novamente para esclarecer alguma dúvida ou fazer uma comparação, algo que é incrivelmente mais fácil nos textos convencionais.

Isso serve também para os noticiários que estão sendo substituídos, nos portais de notícias, por vídeos de gente com voz esganiçada, cheios de caras e bocas, em lugar da pura e simples escrita para que o leitor tome conhecimento de fatos, e não de expressões

Resumindo:
sou um dinossauro disposto a voltar a ler cuneiforme nas tábuas de argila mesopotâmicas.
Trequinolojia serve para outras coisas, mas não para substituir papiros e livros.

Dicionário das Religiões

Dicionário das Religiões, é uma obra póstuma (1990) de Mircea Eliade (1971-1986) organizada por Ioan Petru Couliano (1950-1991) (WMF Martins Fontes, 2019, 344 p., R$ 84,90, tradução de Ivone Castilho Benedetti, revisão de Maria Ermantina Galvão), baseada nos três volumes da História das Religiões (1969-1985).

Dividido em 33 capítulos, organizados geogràficamente ou em ordem alfabética das variedades, aborda definições de religiões, desde a pré-história, todos seguidos de uma bibliografia sobre o respectivo tema.
Em muitos casos, os capítulos têm apenas duas ou quatro páginas (Austrália, Canaã, Celtas, Hititas, …), sem aprofundamento.
Outros, como o budismo, o cristianismo, o islamismo e o judaísmo, ocupam várias páginas e subcapítulos.

De modo geral, há mais uma relação de nomes relacionados a cada religião do que a identificação de seus significados.

Vários temas sequer são mencionados (fé Bahai, doutrina de Alan Kardec, movimento Rajneesh).

De modo geral, os capítulos mais longos preocupam-se com o platonismo e com o neoplatonismo em seu pensamento, e na maioria dos verbetes as relações e semelhanças entre as diferentes religiões mal são levantadas.

Uma obra que não atinge o objetivo de esclarecer as muitas “coincidências” entre as diversas denominações religiosas.
Obras como o Dicionário das Religiões, de John R. Hinnells (1984), ou Pequena História das Grandes Religiões, de Félicien Challaye (1947) são muito mais elucidativas.

Cabe, por fim, observar a fraca revisão do texto.

Contos do nascer da Terra

livro010Contos do nascer da Terra, de Mia Couto (Companhia das Letras, 2014, 270 p,, R$ 21,00) contém 35 textos do renomado escritor moçambicano, um dos maiores expoentes da literatura em língua portuguesa contemporânea.

Em todos eles, a característica de criar palavras, a partir de dois conceitos que se somam ou se opõem, como O homem era um vidabundo, ou Minha água-natal, de freqüentemente alterar ditos e provérbios, como Não ata nem diz ata, e de formar frases com palavras de som assemelhado, como Um homem atravessou a calçada, desavultado vulto avulso.

Os contos muitas vezes relatam casos da relação entre pais e filhos, ou de casamentos desfeitos, de pessoas vítimas da guerra civil que marcou a fase da independência de Moçambique, ou são adaptações de fábulas africanas. Na verdade, preferi ler os contos criados do que as fábulas adaptadas, que se tornaram em geral sem forma nem formato, desenroladamente roliças.

A leitura dos contos é um constante exercício para os olhos e para as idéias do escritor e do leitor, para quem utiliza os neurônios subjacentes da linguagem.

Mia Côunto: leitura obrigatória.

 

Eduardo VII

Eduardo VII, de André Maurois (Globo Livros, 2014, 303 p. R$ 49,90), foi escrito em 1933, mas só agora é publicado no Brasil, em função do centenário do início da Primeira Guerra Mundial (embora o Rei tenha morrido em 1910).
O título original inglês é Rei Eduardo VII e seu tempo, já o título brasileiro é Depois da Rainha Victoria, Edward VII.

Eduardo VII tinha já 54 anos, quando ascendeu ao trono, em sucessão a sua mãe, a famosa Rainha Vitória. Por isso, a parte inicial do livro trata de assuntos do reinado de Vitória, a mãezona do Império Britânico, e que era de certo modo também a avòzona do mundo todo.

Vitória, sob a influência do marido alemão Alberto (embora ele tenha morrido com apenas 44 anos), transformou a corte inglesa da futilidade das dinastias francesas (Bourbon, Orléans e Bonaparte) para um reinado voltado para a burguesia, deixando de fora a velha aristocracia.
Vitória governava para a classe média.
Pobres ela não sabia como eram, mas aristocratas ela atirou no lixo.

Eduardo Alberto, ainda príncipe de Gales, fez uma viagem oficial aos Estados Unidos, a primeira na história das relações entre os dois países, e foi tão adorado pelos americanos, que pediram que ele voltasse dali a uns anos para se candidatar a presidente dos EUA. Descobriram a frustração de serem uma reles republiqueta, coisa que se estendeu por todos os presidentes seguintes. Mesmo no enterro de Eduardo VII, em 1910, a presença do ex-presidente Theodore Roosevelt deu sinal de que as repúblicas eram países de segunda categoria no início do século XX.

Tinha aprendido com a mãe que o rei reina, não governa, mas tem (e exerce) o direito de saber,  direito de encorajar e o direito de advertir. Aliás, é assim que os ingleses funcionam até hoje.

O curto reinado de Eduardo VII, apenas nove anos, foi contudo marcado por muitas mudanças. As tradicionais disputas políticas entre Conservadores e Liberais adquirem o novo componente do Partido Trabalhista, fala-se muito do Home Rule na Irlanda, a mudança na composição da Câmara dos Lordes, para eliminar o poder de veto que ainda mantinha sobre decisões tomadas na Câmara dos Comuns, e o Rei jogou com muita habilidade no entendimento que buscava entre todas as partes. Também durante seu reinado ocorreram as manifestações em favor do voto feminino (as suffragettes), que passou a valer logo após o término da Grande Guerra.

Fora isso, se o reinado de Vitória foi o império do trem, Eduardo VII deu início ao império da bicicleta e do automóvel. Jorge V, mais tarde, veria o império do avião.

As relações de amizade que mantinha, desde quando ainda Príncipe de Gales, serviram para acomodar muito do trabalho de diplomacia a que ele se interessava, com outros monarcas europeus, bem como com os presidentes franceses. Inspirou a aproximação com a França e com a Rússia, promovendo a Entente Cordiale, que se contrapôs à Tríplice Aliança montada pela Alemanha, pela Áustria-Hungria e, na época, a Itália.

As relações com o sobrinho, o Kaiser Guilherme II, porém, sempre foram cheias de desconfiança, e foram tornando mais difíceis as que envolviam seus países.

Por acaso tenho lido outros artigos, que agora vêm sendo publicados por conta dos cem anos da Grande Guerra, e parece haver unanimidade em que o comportamento psicològicamente doentio do Kaiser foi decisivo para o desencadeamento do conflito. Segundo alguns autores, não houve sequer uma II Guerra, pois aquela primeira nunca chegou a ser concluída.

Nisso erram historiadores marxistas, que insistem em que a economia é a causa de todos os arranques e de todas as alterações. Podem contribuir para o surgimento de cenários propícios, mas figuras execráveis como Napoleinho, o Kaiser, Stálin e Hitler deram o tom final para que a História tomasse rumos desastrosos. Sem eles, até mesmo os desastres econômicos teriam sido menores. Pessoas têm sim um poder muito grande de modificar rumos de povos.

Ah, só um lembrete: fumar faz mal à saúde.

Os Grandes Contos Populares do Mundo

Os Grandes Contos Populares do Mundo (Ediouro, 432 p., 2005) é uma das coletâneas organizadas por Flávio Moreira Garcia, responsável também por coleções sobre contos eróticos e contos de humor.

Pequenas histórias de lugares tão díspares quanto Afeganistão, Guatemala, Irlanda e Moçambique.

Histórias de mitologia, como os egípcios Osíris e Ísis, os gregos Édipo, O Rei Midas e O Minotauro, os bíblicos Sansão e Salomão e a Rainha de Sabá. Histórias clássicas como trechos de As Mil e Uma Noites (Ali Babá e Os Quarenta Ladrões, Sindbad o Marujo), uma versão adaptada de Romeu e Julieta (Shakespeare), O Barba Azul (Perrault), A Nova Roupa do Rei (Andersen), a lenda suíça de Guilherme Tell, e o humorístico português O Caldo de Pedra (conhecida história de como fazer uma sopa à base de uma pedra lavada).

Uma considerável parte dos 83 contos eu conhecia, e foi realmente gostoso ter a oportunidade de reler histórias que eu tinha conhecido na infância. Os ingleses João e O Pé de Feijão, e O Matador de Gigantes, o trabalho de Andersen sobre O Bravo Soldadinho de Lata (para mim era um soldadinho de chumbo), o turco O Relógio, de Khawajah Nasr Al-Din.

Para representar o Brasil, foram selecionados sete contos:

  • O Ciclo de Pedro Malazarte
  • Mãe d’Água
  • As Proezas de Macunaíma
  • O Princípio do Mundo
  • Xangô (adaptação da mitologia africana)
  • O Baile do Judeu (do amazonense Inglês de Sousa)
  • A Mboitatá, do gauchíssimo Simões Lopes Neto.

Aí vem a imensa grande enorme diferença. Os contos dos outros países têm cunho moral, mesmo quando os heróis aproveitam uma capacidade de esperteza para ludibriar inimigos. O resultado é que as histórias são feitas para ressaltar vantagens da honestidade, do trabalho, do respeito aos mais velhos.
Pois nos contos e lendas brasileiras, exceto a da Boitatá, prevalece a mentira, a falta de caráter, a trampa enganadora.
De Manunaíma, o herói sem nenhum caráter, não preciso comentar. Pedro Malazarte era apenas um Más Artes, O Baile do Judeu é a aparição do Boto, …
Uma amiga que é candomblecista baiana desmentiu essa versão de Xangô. Foi abrasileirado para tornar-se um aproveitador da primeira mulher, o que não ocorreria na lenda original africana.

Qualquer semelhança entre os contos e os povos não deve ser mera coincidência.

Ah, caso alguém não saiba: esperteza não é sinônimo de mau-caratismo.

Pré-história

Pré-história, do autor inglês Chris Gosden (L&PM Pocket, 158 p., 2012, R$ 15,00), é um livro que nos dá algumas informações sobre o período da humanidade sem registros escritos que fogem o padrão a que fomos habituados.

Quando é a pré-história? Em qualquer momento. A maior parte dos indígenas da América sempre viveu na pré-história, apenas com tradições orais para manter vivas algumas lembranças. O mesmo vale para povos africanos ou da Oceania. Todas as informações materiais sobre eles só podem obtidas a partir de vestígios arqueológicos, que conduzem a teorias, diferentemente da história de povos que já deixaram o cenário mundial, como assírios, egípcios, ou outros que ainda permanecem, como chineses ou povos da península indiana.

Muitas das informações sobre como viviam esses povos é obtida a partir de vestígios como restos de algum vestuário, a cerâmica, a utilização de metais ou de ossos usados como armas. Igualmente relevantes, porém, são os vestígios de alimentos, animais ou vegetais, que dão traços de sociedades mais patriarcais ou matriarcais, mais nômades ou mais sedentárias. Restos funerários, e eventuais adornos, também são fontes de informações / especulações sobre o modo de vida dos humanos.

No caso dos neandertais, nossos primos, mas não antepassados, pode-se saber que, dadas as características físicas, não possuíam o mesmo estilo de linguagem oral dos homo sapiens. O autor coloca, com humor, que provàvelmente a linguagem de desenvolveu mais para fazer fofocas do que para assuntos muito elaborados, tal como é utilizada até hoje pelos humanos.

Um conceito, pràticamente tabu, que o autor desmonta, é o das floras autóctones na Oceania, pois pode-se afirmar hoje em dia que os  habitantes que partiram da Papua Nova Guiné (onde viveu o último povo pré-histórico a ter contacto, já no século XX, com os “civilizados”) para as ilhas da Oceania a leste, levavam consigo as plantas que conheciam, para com elas moldar a paisagem de “paraísos” como a Polinésia Francesa do modo que lhes pudessem dar a noção de que mantinham a relação com a terra de origem. Nada mais falso do que supor que eles tivessem  a preocupação “ecológica” de “preservação” de espécies nativas, sem a “contaminação” de outras transplantadas. O ambiente servia ao humano.

O livro às vezes torna-se um pouco lento, na descrição de sítios arqueológicos, mas na maior parte da obra a leitura é ágil e até mesmo divertida.

A pré-história não é um período tão distante de nós nem, muito menos, desinteressante.