islamismo

Dicionário das Religiões

Dicionário das Religiões, é uma obra póstuma (1990) de Mircea Eliade (1971-1986) organizada por Ioan Petru Couliano (1950-1991) (WMF Martins Fontes, 2019, 344 p., R$ 84,90, tradução de Ivone Castilho Benedetti, revisão de Maria Ermantina Galvão), baseada nos três volumes da História das Religiões (1969-1985).

Dividido em 33 capítulos, organizados geogràficamente ou em ordem alfabética das variedades, aborda definições de religiões, desde a pré-história, todos seguidos de uma bibliografia sobre o respectivo tema.
Em muitos casos, os capítulos têm apenas duas ou quatro páginas (Austrália, Canaã, Celtas, Hititas, …), sem aprofundamento.
Outros, como o budismo, o cristianismo, o islamismo e o judaísmo, ocupam várias páginas e subcapítulos.

De modo geral, há mais uma relação de nomes relacionados a cada religião do que a identificação de seus significados.

Vários temas sequer são mencionados (fé Bahai, doutrina de Alan Kardec, movimento Rajneesh).

De modo geral, os capítulos mais longos preocupam-se com o platonismo e com o neoplatonismo em seu pensamento, e na maioria dos verbetes as relações e semelhanças entre as diferentes religiões mal são levantadas.

Uma obra que não atinge o objetivo de esclarecer as muitas “coincidências” entre as diversas denominações religiosas.
Obras como o Dicionário das Religiões, de John R. Hinnells (1984), ou Pequena História das Grandes Religiões, de Félicien Challaye (1947) são muito mais elucidativas.

Cabe, por fim, observar a fraca revisão do texto.

A Sábia Ingenuidade do Dr. João Pinto Grande

Encontrei alguns elogios a respeito de Yuri Vieira e procurei em uma livraria alguma obra sua. A única à venda era “A Sábia Ingenuidade do Dr. João Pinto Grande” (Editora Record, 2017, 306 p., R$ 44,90).

O livro seria uma coleção de contos, todos porém interligados ao personagem advogado que lhe dá nome.

Os contos têm os seguintes títulos:

  1. O machista feminista – uma longa divagação sobre um ilusionista que finge ser extra-terrestre e fala da invasão islâmica na Europa em um boteco de Vila Madalena;
  2. O Prompt de Comando ou A sábia ingenuidade do Dr. João Pinto Grande – sobre bullying e racismo;
  3. A teologia da maconha – a respeito de um casal e o vizinho policial;
  4. O pedinte do metrô – uma enxurrada de moralismo do personagem principal em uma viagem de metrô;
  5. A menina branca – o uso excessivo das comunidades sociais e a violência na periferia de São Paulo;
  6. Amarás ao teu vizinho – uma discussão entre ex-vizinhos durante jantar na casa de um ex-militar sérvio; somada à filosofia de um bêbado da vizinhança;
  7. A Satoshi o que é de Satoshi (somente para nerds e geeks) –outra longa divagação, dessa vez sobre bitcoins e a possibilidade de corrupção da justiça, durante um almoço de pizza e cerveja (péssima escolha para um almoço, por sinal, mas normal para o mau gosto gastronômico dos paulistanos).

Confesso que não gostei dos capítulos.
O texto na maior parte é recheado com a preocupação em “escrever certinho”. Sobretudo certinho demais para diálogos.

Os capítulos teòricamente não têm data (embora sejam muito bem datados na contemporaneidade), mas a descrição geográfica é excessiva.
Parece que o autor considera que os assuntos abordados são exclusividade de São Paulo, e não de qualquer outra cidade do Brasil (ou do mundo).
Surpreendente, para alguém que já viveu em diferentes cidades e países.
Já que não o livro não tem data, que tal se não tivesse endereço?
Haveria a eliminação de aborrecidos detalhes sobre o trajeto em automóvel, por exemplo.

Ao longo do texto, Yuri Vieira recheia o desenrolar dos contos com a exposição de suas idéias políticas – nem sempre com muita clareza.

A futura leitura de outra obra poderá me dar uma visão mais clara sobre minha opinião a respeito de Yuri.

As Máscaras de Deus – Mitologia Ocidental

O quarto capítulo de As Máscaras de Deus – Mitologia Ocidental (terceiro volume da tetralogia de Joseph Campbell, Editora Palas Athena, tradução de Carmen Fischer, 1998, 472 p.) inicia-se com:

Felizmente não será necessário argumentar que os mitos gregos, célticos ou germânicos eram mitológicos. Os próprios povos sabiam que se tratava de mitos e os estudiosos europeus, ao lidar com eles, não se sentiram persuadidos pela idéia de que houvesse algo especialmente sagrado no tema.

Nos capítulos anteriores, o autor desmontou o mito de Moisés. Aliás, Sigmund Freud, já tinha feito isso, em Moisés e o Monoteísmo, que é citado em várias páginas do terceiro capítulo.

Foi também mencionado que a Torre de Babel é apenas o inverso do zigurate. Não para os homens subirem aos deuses, mas para os deuses descerem até os homens…

Logo no segundo capítulo, Maria é desconstruída, dadas suas semelhanças com outros mitos, como a egípcia Ísis, a frígia Pessinus, e outras lendas.

O livro, concluído em 1964, aborda as mitologias celtas, germânico-escandinavas, greco-latinas, zoroastrismo, judaísmo, cristianismo e suas vertentes, mitraísmo, islamismo, e conclui que a ciência estava a caminho de derrotar as religiões. Campbell deveria aguardar mais umas décadas, para ver o violento retorno de certas religiões e seitas…

Ah, Feliz Natal de 2017…
Dia Internacional do Comércio.
Embora muita gente venha com aquela conversa de que o solstício é dia do aniversário de mais um salvador da humanidade…Saoshyant, representado pelo Sol Invicto.

 

P.S. 31 de dezembro
Antes de morrer, Campbell pode não ter visto o recrudescimento fundamentalista do maometismo e do cristianismo, MAS viu o retorno dos mitos célticos e vikings,  a criação do rastafarianismo e toda a prole de cultos new age pseudo-hinduístas.

 

Maomé, uma biografia do profeta

Maomé, uma biografia do profeta, de Karen Armstrong (Companhia das Letras, 2002, 335 p., tradução de Andréia Guerini, Fabiano Seixas Fernandes, Walter Carlos Costa), foi escrito em 1994, como uma resposta politicamente correta à fatwa decretada em 1889 contra Salman Rushdie, por este ter escrito Os Versos Satânicos.

Karen Armstrong, ex-freira católica britânica (de família irlandesa) parece que “viajou na maionese” quando escreveu este livro, e a editora também o fez, com a publicação no Brasil em 2002 (pós-11 de Setembro), e me pergunto como será que seria a obra hoje, em 2016?

(entrevista de Karen Armstrong a Paulo Daniel Farhat, na Folha de São Paulo, em 2002)

Primeira pergunta:
por que hoje em dia se usa sempre o termo “muçulmano” ou “islamita”. Ficou “feio” dizer “maometano”, como se fazia, no Ocidente, até a década de 1960.
Quem segue Cristo não é cristão?
Os seguidores de Lutero não são luteranos?
Os de Calvino não são calvinistas?
Os de Buda não são budistas?
Os de Confúcio não são confucionistas?
Os de Alan Kardec não são kardecistas?
Então por que dizer “maometano” hoje em dia é tido como ofensivo?
Islã significa submissão, e muçulmano “submetido a deus”.
Mas a religião é de Maomé, oras pois…

Já li outros trabalhos da senhora Armstrong (Buda – uma biografia, 2001, Editora Objetiva;  Breve história do mito – Companhia das Letras, 2005; The Bible – the biography, Atlantic Books, 2007), e parece que a autora conseguiu não levar ao pé da letras as fontes utilizadas. Maomé, porém, não teve esse cuidado. Este sem dúvida foi o pior.

Na biografia de Buda, ela esclareceu um monte de coisas interessantes para destruir o mito. Sidarta Gautama não era um príncipe em um castelo, mas um aristocrata em uma pequena república (como mais tarde foi Veneza).
Na biografia de Maomé, ela recheia de situações poéticas e de êxtases para reforçar o visionário, reforça o tempo todo as lendas, como a do “velho que inundou a barba de tantas lágrimas, ao ouvir os versos recitados pelo profeta”.
Se o pequeno país de Sidarta era um descrito com termos adequados ao momento histórico, na biografia de Maomé Karen o coloca literalmente como um socialista que combateu o capitalismo de Meca! Usa mesmo essas palavras! Apesar de todo o tribalismo e sistema de clãs que ela repete em citar em cada página.

Ela coloca um saque a uma caravana como um acontecimento que demonstrou à seita que se iniciava a “revelação da vontade de deus – um princípio importante no monoteísmo histórico”, e páginas adiante compara as guerras tribais entre Medina e Meca com Moisés e a travessia do Mar Vermelho (e a morte dos egípcios).
No mesmo parágrafo, aponta que “se não se fizesse oposição militar a regimes tirânicos e repugnantes, o mal tomaria conta do mundo todo. Até os profetas, algumas vezes, foram compelidos a lutar e matar”… “em vez de ser uma religião dá a outra face, o islã luta contra a tirania e a injustiça”. – pois é, preciso comentar? Parece que o vírus da admiração dominava o cérebro da autora quando escreveu o livro.

A obra fala muitas vezes entre lutas entre judeus (sempre monoteístas) e os novos adoradores de um deus único. Parece admitir que isso é “uma sina do mundo”.   E os muçulmanos sempre foram tolerantes com os judeus, até a fundação do Estado de Israel, segundo ela… Acho que Karen não sabe a história do califado almôada em Andaluzia, no século XII.

O “amor” que Maomé tinha por todas suas esposas (inclusive a menina Aisha, de 9 anos), e por todas as meninas, é tão lindo como dizer da admiração que o “pai do pacifismo” Gandhi tinha quando se deitava com crianças.

Karen afirma que
“O véu não visava rebaixar as esposas de Maomé, mas era um símbolo de status superior. … Mais tarde, outras mulheres ficaram com ciúmes do status das esposas de Maomé e exigiram que lhes fosse permitido usar véu. … Hoje em dia, quando algumas muçulmanas resgatam a vestimenta tradicional, não é porque sofreram lavagem cerebral de uma religião chauvinista, mas porque consideram profundamente gratificante o retorno às próprias raízes culturais. É também, não raro, uma rejeição da atitude imperialista ocidental.“
Curioso que, atualmente, a maioria das freiras católicas não veja o uso do hábito como sinal de orgulho. Menos ainda por parte da sra. Armstrong.

“O Corão ensina que a guerra é sempre abominável. Os muçulmanos nunca devem começar as hostilidades, pois a única guerra justa é a de autodefesa, mas, uma vez engajados, devem lutar com absoluta confiança para conduzir a luta a um final o mais rápido possível.”

Acho que a autora precisava ler mais os noticiários internacionais, e talvez reformular o livro.
Afinal de contas, se em 2002 ela ainda não tinha sequer tomado conhecimento dos ataques em Nova York e Washington, o que será que ela tem a dizer das guerras na Síria e no Iraque, dos ditadores muçulmanos, dos atentados em San Bernardino, Boston, Madri, Paris 1 e 2, Bruxelas, Londres, Nairóbi 1 e 2, Dar-es-Salaam, Moscou (Teatro Dubrovka), Bali, praias na Tunísia, turistas no Egito, e outros “pequenos detalhes”, como Boko Haram?

Segundo a ex-freira, a a culpa de termos uma visão oposta é da igreja católica.
Claro, é sempre ela a malvada que deturpou o pensamento da humanidade
(desde a pré-história, segundo alguns).

Reproduzo o último parágrafo do livro:
“O fato é que o islã e o Ocidente compartilham uma tradição comum. Os muçulmanos a reconhecem desde o tempo do profeta Maomé, mas isso é algo que o Ocidental não consegue aceitar. Hoje, alguns muçulmanos começam a se voltar contra as culturas do Povo do Livro que os humilhou e desprezou. Elas começam a islamizar seu novo ódio. A amada figura do profeta Maomé tornou-se central nos últimos embates entre os islã e o Ocidente durante o caso Salman Rushdie. Se os muçulmanos precisam, hoje em dia, de uma compreensão mais apurada de nossas tradições e instituições ocidentais, nós, no Ocidente, precisamos nos desvencilhar de nosso antigo preconceito. Talvez um bom ponto de partida seja a figura de Maomé, um homem complexo e apaixonado, que por vezes tomou atitudes para nós difíceis de aceitar, mas foi um homem genial e fumdpou uma religião e uma tradição cultural baseada não na espada – apesar do mito ocidental [e de tudo que foi narrado no próprio livro de Karen Armstrong] – e cujo nome, “islã”, quer dizer paz e reconciliação.”

Bem, em algumas páginas anteriores a autora relata os últimos dias do profeta, e da angustiante dor de cabeça.
Que pena que naquela época, e naquela região, não houvesse equipamentos para uma tomografia e outros exames, que fossem capaz de examinar o crânio que “trouxe mensagem de paz ao mundo”…

Em algumas parte do livro, Karen coloca o monoteísmo como uma necessidade “da evolução dos homens”, para sair do tribalismo.
Para mim, reforçou a fé no panteão de deuses de klingons, romulanos, wookiees (como Chewbacca), pois estou cansado desse antropocentrismo pobre de planeta que os alemães chamam de Erde.

Am I a Hindu?

Am I a Hindu – The Hinduism Primer, de Ed Viswanathan (Rupa & Co.; Rs 95; 1997; 321 p.), é um livro que comprei em 1999 em um sebo na Coréia do Sul (paguei W 15.000, equivalentes, no câmbio de hoje, a US$ 13,55) e que nunca consigo terminar de ler.

Viswanathan é um engenheiro elétrico que vive em Nova Orleans, e tenta explicar ao filho, de 14 anos, os fundamentos da religião da família.
Todo o livro, escrito em 1992, discorre como se fosse um diálogo entre filho e pai, de dúvidas e respostas.

Parece interessante, MAS o livro prende-se todo o tempo a comparar o hinduísmo com as religiões monoteístas surgidas no Oriente Médio (judaísmo, cristianismo e islamismo).
Acredito que por conta da influência da cultura dos Estados Unidos no adolescente, o pai achou que seria mais conveniente falar sobre hinduísmo com Moisés, Jesus e Maomé, citando os evangelhos cristãos em comparação com os livros sagrados do hinduísmo.

Resultado: não convence a quem quer saber sobre a religião dos hindus.
Saber sobre ela, e não sobre o que pensam os monoteístas do Oriente Médio.

Além disso, como o autor é um drávida, “falhas” e “defeitos”, como castas e o antigo ritual de queimar as viúvas junto com o corpo do marido, ficam por conta dos arianos.
Já ouvi de um drávida (tâmil, mais especificamente) que conheci, que os invasores arianos são inferiores aos drávidas, em termos culturais.

Descobri este ano que versão pdf do livro está disponível na internet.
Bem, em 1999 duvido que estivesse à disposição dos leitores.

P.S.  O autor diz que qualquer pessoa que aceite o hinduísmo é considerada hindu.
Já conversei com um hindu (ariano) que diz o contrário: para ser hindu é necessário nascer hindu, pois a religião é étnica.
Esse hindu ariano ainda afirmou que os “gurus” e outros quetais, que fazem proselitismo da religião, nada mais são do que espertalhões enganando europeus e americanos.

Soumission

Soumission, de Michel Houellebecq (300 p., Flammarion, 2015, R$ 85,00).
O autor escreveu sobre o “risco islâmico” na civilização européia, antes que tivesse ocorrido a matança no Charlie Hebdo, e outras coisas do tipo, que já ocorreram depois.  O lançamento do livro, coincidentemente, ocorreu no mesmo dia do atentado.
Trata-se de um “romance visionário”, que alguns comentaristas comparam com os de Aldous Huxley ou de George Orwell.
Uma quinta parte do livro é para descrever quais foram as bebidas ou comidas que o professor-narrador quarentão ingeriu.
Uma terça parte é para narrar as trepadas que ele teve, com alunas, ou com moças da difícil vida fácil.
A parte essencial do livro é escrita para falar da islamização da Europa.
Bem, no final, com chefes de governo islamitas eleitos na França e na Bélgica, na década de 2020 a União Européia expande-se para a Turquia, Marrocos, Argélia, Tunísia, Egito e Líbano, no plano islâmico de restaurar o Império de César Augusto, com o comentário de “como era boa a Idade Média. O problema da Europa foi ter decaído tanto com o Renascimento… ”
O livro é visto como uma comparação entre a queda da república romana e sua substituição pelo império, e o fim dos valores europeus laicos que têm vigido nas “democracias” atuais.
Sorbonne (e Oxford) é privatizada e islamizada, subsidiada pela monarquia saudita (ou catari).
As mulheres passaram a ter de se vestir sòbriamente (outra vez), pràticamente não saem mais às ruas, têm os estudos limitados, não ocupam mais cargos de empregos (o que permite que os homens ganhem mais), o que, como conseqüência óbvia provoca a redução do desemprego.
Com a poligamia instaurada na Europa, os homens têm uma mulher mais velha para cuidar da casa, e outra, adolescente, para levar para a cama, e que sempre será uma adolescente mimada.
Bem, o livro é assustador, visto como uma perspectiva concreta para as próximas décadas,
e realmente dá nojo a gente ver o que fazem os políticos e os “intelectuais” para continuarem em suas boquinhas, mamatas, etcéteras, abrindo mão de qualquer afirmação que antes expressassem.
Essa é a parte mais importante, e que merece reflexão de todos nós:
o que eles podem fazer para salvar a própria pele, não importa o que seja mais ético e/ou necessário.
Críticos “intelectuais” e revistas com “perfil político” criticaram o livro, considerando-o a mais fraca das obras de Houllebecq.
Outros o elogiaram, pela capacidade de fazer ficção a partir de uma análise dos valores sociais contemporâneos.
De qualquer forma, acredito que valha a pena sua leitura com todos os ângulos de pontos de vista. Exatamente como as críticas contidas nas obras “futuristas” de Orwell ou Huxley.

La Confrérie des Éveillés

La Confrérie des Éveillés, de Jacques Attali (Livre de Poche – Fayard, 2004, 312 p., 6,5 €), é um romance histórico, que se passa no período entre 1149 e 1165, quando o islamismo vê surgir um grupo de fanáticos que, ao assumir comando político do Norte da África e da Andaluzia, abala a relação de convívio que existia, até então, entre muçulmanos e judeus.

Os personagens principais do livro são “simplesmente” ibn Rash, o Averróis, médico, filósofo e astrônomo árabe (1126-1198), e Moshé ben Maimon, o Maimônides, médico e filósofo judeu (1135-1204), ambos nascido e criados em Córdoba. Época muito importante para o pensamento religioso, ético e filosófico no mundo todo, pois o cristianismo conheceu, no mesmo período Thomas Becket (1120-1170).

Além das cruzadas (e o sultão Saladino – 1137-1198), e das lutas entre os diversos reinos cristãos e emirados muçulmanos na Península Ibérica, a época marca a “redescoberta” de Aristóteles (382-322 a.e.c) como expoente da filosofia clássica grega, e a influência que isso teve em todo o pensamento ocidental, sobretudo na questão entre fé e ciência.

Os “éveillés” (despertos) seriam pessoas espalhadas pelo mundo, desde Cochin (no extremo sul da Índia) até a Península Ibérica. Essas poucas pessoas teriam tido contacto, e conhecido, uma suposta obra de Aristóteles, o Tratado da eternidade absoluta, que seria mantida em segredo pelo grupo, pois poderia causar o desmoronamento das instituições eclesiásticas de todas as religiões, baseadas exclusivamente na fé.
No romance, Maimônides e Averróis fazem parte das pessoas que buscam encontrar traduções escondidas da obra de Aristóteles, para o latim e para o árabe, feitas por Geraldo de Cremona (1114-1187) em Toledo.

As conversas entre Averróis e Maimônides, os debates e também as disputas com grupos das três religiões monoteístas abraâmicas, ocupam boa parte do romance, que prende a atenção por essas comparações. Mostra uma intolerância religiosa crescente, que perdura até hoje, apesar de todos os pensamentos unificadores que poderiam ser encontrados em Aristóteles, que teria se inspirado também na filosofia budista (Buda – 563-483 a.e.c).

O livro prende a atenção, mas requer algum conhecimento prévio sobre os personagens, História, e algumas noções de filosofia e das três religiões abraâmicas. Recomendo a leitura.

A leitura do livro no original em francês não deixa de ser uma oportunidade para comparar o cuidado que têm escritores naquela língua com a riqueza gramatical subjacente em cada frase, algo que lamentàvelmente muitos escritores em língua portuguesa parecem pretender destruir.