Companhia das Letras

Um homem: Klaus Klump

Ganhei Um Homem: Klaus Klump, de Gonçalo M. Tavares (Companhia das Letras, 2007, 116 p.), foi publicado em Portugal em 2003 e editado no Brasil conforme a grafia portuguesa, e não sob as regras do desacordo ortográfico.

Narra um país em guerra, sob ocupação militar, em que os sons das armas se elevam inclusive aos da língua local.

Klaus Klump é membro de uma rica família, que tem como atividade editar livros contra a política e o sistema econômico, indiferente ao regime militar, até que sua amante é violentada por soldados, o que o leva a optar pela guerrilha, sendo contudo aprisionado.

Outros personagens se acercam à narrativa, ao longo de vários anos de guerra e posteriormente de paz, e ocupam a vida de Klaus.

Após o retorno da vida civil e democrática, como membro da classe abastada, Klaus assume a direção dos negócios familiares, abrindo mão dos ideais revolucionários que havia anteriormente assumido.

Durante o período de guerra, a narrativa é repetitiva e enfatiza as máquinas. Não pude deixar de sentir uma sombra das obras do realismo fantástico, escritas pelo goiano José J. Veiga durante as décadas de 1980 e 1990.
Terminada a guerra no romance de Gonçalo Tavares, a narrativa assume outra forma, de menos efeitos e de mais linearidade.

Não deixa uma impressão além da obviedade do comportamento humano.
Terei de ler outras obras do autor português para estar capacitado a opinar sobre que tipo de emoção ele deixou (ou não) em mim. Até agora pareceu déjà vu.

Cada homem é uma raça

Cada homem é uma raça, de Mia Couto (Companhia das Letras – 2015 – 200 p., R$ 39,90) contém 11 contos, originalmente publicados em 1990.

O grande escritor moçambicano mais uma vez destaca sua capacidade de criar cenários e palavras.

Os contos, porém, não diferem muito uns dos outros. A Rosa Caramela; Rosalinda a nenhuma; A princesa russa; O ex-futuro padre e sua pré-viúva; Mulher de mim; A lenda da noiva e do forasteiro; Os mastros do Paralém falam de um amor impossível entre uma mulher e um homem. São previsíveis.

O apocalipse privado de tio Geguê; e Sidney Poitier na barbearia de Firipe Beruberu foram os dois de que eu mais gostei.
Outros dois contos no livro são O Embodeiro que sonhava pássaros, bastante poético; e O pescador cego.

Concluí a leitura sem ter a mesma excelente impressão que havia tido com Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra;  e com Contos do nascer da Terra.

Fica porém a dica para sempre se procurar uma obra de Mia Couto, para descansar os olhos e exercitar o cérebro.

Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra

livro009Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra é um interessante romance de Mia Couto (Companhia das Letras, 2009, 262 p., R$ 26,00).
Narra a história de Mariano, jovem que mora na cidade e é chamado para o funeral do avô Dito Mariano, na pequena aldeia de Ilha-do-Chão, à margem do Rio Madzimi. Ali ele reencontra o pai Fulano Malta, os tios Abstinêncio e Ultímio, a avó Dulcineusa, a tia-avó Admirança, a gorda cunhada da avó Miserinha, o português Padre Nunes, e o médico goês Amílcar Mascarenha. Vai sendo levado às lembranças de sua mãe Mariavilhosa, que se afogara no rio.

No rio se passam as histórias das pessoas da aldeia, o porto, a corrupção dos agentes do governo, o tráfico de drogas, as bebidas.
Na casa do avô, chamada Nyumba-Kaya, junção da palavra “casa” nas línguas do Norte e do Sul,  já com partes em ruínas, desenrola-se um funeral que demora para ser realizado, com o teto arrancado para que o velório não a poluísse de maus fluidos.
Cartas psicografas vão sendo encontradas por Mariano, e ele paulatinamente ele descobre segredos da família, e de outras pessoas da Ilha-do-Chão.

Uma soma de frustrações, de (auto-)enganos, desejos e adultérios percorre as páginas do livro.
Nos últimos dos vinte e dois capítulos, um tom mais de lirismo na prosa começa a permear o romance, de modo a chegar a uma conclusão sobre a vida daquelas pessoas no tempo e naquela terra.

Uma leitura recomendável, um excelente exercício mental para quem percorre suas páginas.

 

Contos do nascer da Terra

livro010Contos do nascer da Terra, de Mia Couto (Companhia das Letras, 2014, 270 p,, R$ 21,00) contém 35 textos do renomado escritor moçambicano, um dos maiores expoentes da literatura em língua portuguesa contemporânea.

Em todos eles, a característica de criar palavras, a partir de dois conceitos que se somam ou se opõem, como O homem era um vidabundo, ou Minha água-natal, de freqüentemente alterar ditos e provérbios, como Não ata nem diz ata, e de formar frases com palavras de som assemelhado, como Um homem atravessou a calçada, desavultado vulto avulso.

Os contos muitas vezes relatam casos da relação entre pais e filhos, ou de casamentos desfeitos, de pessoas vítimas da guerra civil que marcou a fase da independência de Moçambique, ou são adaptações de fábulas africanas. Na verdade, preferi ler os contos criados do que as fábulas adaptadas, que se tornaram em geral sem forma nem formato, desenroladamente roliças.

A leitura dos contos é um constante exercício para os olhos e para as idéias do escritor e do leitor, para quem utiliza os neurônios subjacentes da linguagem.

Mia Côunto: leitura obrigatória.

 

47 contos de Isaac Bashevis Singer

Concluí hoje a leitura de um dos melhores livros que desbravei nestes últimos tempos:

47 contos de Isaac Bashevis Singer (Companhia das Letras, 720p., 2004, R$ 31,00), com excelente prefácio de Moacyr Scliar.

Os contos são quase todos impregnados de indisfarçável caráter auto-bio-gráfico.
Como são contos, não cansa a leitura.
Cada um é cada um.
Dentre eles está Yentl, que foi tornado peça de teatro, em 1975, e depois filme, com Barbra Streisand, em 1983.

Há contos passados na Polônia sem data, relatos que ele ouvia durante a infância, outros na Polônia do início do século XX (período ainda sob domínio russo-austro-alemão), outros pré-Segunda Guerra Mundial.
Contos mais modernos se passam nos Estados Unidos – Nova York ou Flórida – no período pós-Segunda Guerra, ou em Israel, e até mesmo na Argentina.
Muitas palavras ou expressões estão em  iídiche, mas nada impossível de ser aprendido no glossário.

O que me surpreendeu foram as lições sobre o judaísmo.
Nunca imaginara que fossem tão tão tão supersticiosos!
Diabinhos, talismãs, amuletos, quebrantos, reencarnações, inferno (não eterno), e coisas do tipo em quase todos os capítulos.

Sem contar a tradição do casamento:
as casamenteiras saem para procurar “um bom partido” para ele e para ela.
Se não der certo, porém, nada mais fácil do que obter o divórcio.

Caramba, os judeus ashkenazim são muito mais complicados do que eu pensava…
Só não posso dizer isso a eles.

A tradução de José Roberto Siqueira parece ter sido feita por alguém que não mora no Brasil. Há termos que parecem demasiadamente com dicionários, e não com expressões da língua contemporânea.
A revisão, feita por Ana Maria Barbosa e Carmen S. da Costa também deixa a desejar. Curiosamente, são mais evidentes os erros em um conto que narra a história de um vizinho, que era revisor em um jornal iídiche em Nova York.

Descobri que há muito tempo, durante a adolescência, eu havia lido O Mago de Lublin (traduzido para o português por Rachel de Queiroz), livro escrito por Bashevis em 1960, mas o nome do autor não havia ficado registrado em minha memória – apenas o livro.
Gostei tanto de ler Bashevis, que já me municiei de outros dois livros de sua autoria: O Penitente, e Inimigos: Uma História de Amor, ambos publicados pela L&PM.

 

Associação Judaica de Polícia

Associação Judaica de Polícia, de Michael Chaban (Companhia das Letras, 2009, 472 p., tradução de Luiz A. de Araújo, revisão técnica de George Schlesinger) é um livro que já tentei ler algumas vezes.

Não adianta, não consigo chegar à centésima página.

O texto é chaterrésimo, parece que está sempre começando. Nada se desenrola. Fica sempre nas preliminares.

Hoje este livro sairá da estante e irá – literalmente – para uma lixeira em uma parada de ônibus aqui perto do apartamento.

Até já tentei vendê-lo em um sebo, mas não aceitaram. Disseram que já tem o suficiente desse livro “tão celebrado”.

Prova contumaz de que comentários de “jornalistas especializados” do The Guardian, Associated Press, International Herald Tribune e Esquire nunca devem ser levados em consideração quando se pretende algo parecido com literatura, e não apenas com o ego inflado de “intelectuais”, que pretendem ser engraçadinhos.

Ah, o livro se passa em um hipotético país judeu instalado no Alasca, de língua iídiche, depois de o território israelita ter sido inteiramente ocupado pelos vizinhos árabes.
Zero à esquerda é pouco. Aliás, parece que depois do primeiro zero houve uma vírgula, de tão ruim.

Rimas da Vida e da Morte

Rimas da Vida e da Morte, de Amós Oz (Companhia das Letras, 2008, 118 p., tradução de Paulo Geiger) é um livro de um autor de quem gosto muito, mas que especìficamente não gostei DESTE.

A idéia é muito interessante: um escritor de meia-idade dá uma palestra, e sua mente vagueia enquanto olha as pessoas que estão a seu redor.
Dá-lhes nomes e cria-lhes histórias de vida.
Ótimo.

As histórias porém são meio fracas, repetitivas, esgotam-se, e o autor insistiu em mantê-las na metade final do livro.
Esperava MUITO mais.

Amós Oz, porém, tem de ser relevado, tantas são suas outras boas obras.